Quinta-Feira Santa! Missa Vespertina da Ceia do Senhor

Categories :

“Aceita que dói menos”


Muitas vezes ouvimos a expressão, muito moderna por sinal, “aceita que dói menos”, numa tentativa de mostrar que só aceitando a realidade e a verdade podemos avançar no caminho da nossa vida. Hoje, fazemos memória de um acontecimento difícil de aceitar para alguns: um Deus servidor!

Para os discípulos de Jesus, a realeza e o reino que acreditavam que ele iria instaurar seria semelhante ao reino instaurado pelas monarquias antigas. Um reino triunfalista. E é sobre esta ideia que os discípulos assentam as suas expectativas! Mas a realidade que Jesus lhes apresenta naquela Ceia é completamente diferente. Jesus muda totalmente a lógica e escancara uma porta que culminará naquela Cruz Gloriosa!

Jesus mostra, através daquele gesto simples do lava-pés, que é na humildade e no abaixamento que se mostra a grandeza de Deus! Podíamos dizer que este gesto do lava-pés é a versão joanina da entrada triunfal em Jerusalém, que, de triunfal, na lógica do mundo, não tem nada.

Na verdade, ainda hoje continuamos a não aceitar que Jesus nos lave os pés, tal como Pedro. Na versão sinótica, diríamos que ainda hoje não aceitamos que Jesus se monte num burro e entre na cidade de Jerusalém. São gestos muito desconcertantes porque não se coadunam com tudo aquilo que idealizamos. É por esta incompreensão que neste preciso momento começa o caminho da Cruz de Jesus! É por estes gestos incompreensíveis vindos de um homem que devia ser rei que Judas trai Jesus, que Pedro o nega e que todos os discípulos desaparecem. Por não quererem aceitar esta nova lógica é que Jesus vai para o Calvário só.

Ainda hoje nos custa aceitar que, como batizados, somos chamados a mudar de lógica e custa aceitar mais ainda que, face ao exemplo do Mestre, ainda há muitos de nós cristãos que não compreendem que é no serviço aos nossos irmãos que a nossa vida ganha sentido e verdade!

Este gesto de Jesus faz-nos pensar nas verdadeiras motivações que possuímos na vida!

Quando assumo uma responsabilidade social ou religiosa com que intenção o faço?

Como exerço eu a minha autoridade/liderança? Como olho para aqueles que dependem de mim? São questões que emanam deste relato bíblico e que não podem cair no esquecimento, pois todos os dias somos tentados pela lógica de um mundo onde liderar é mandar, onde humildade é confundida com humilhação, onde servir é servir-se!

A verdadeira Eucaristia, que hoje de forma solene celebramos como instituição, é aquela que nos configura com Cristo que se dá na totalidade. O verdadeiro Sacerdócio, que hoje também se institui, é aquele que vive a máxima: “Quem quiser ser importante, deve tornar-se o mais pequenino e servidor todos”. Mas não nos esqueçamos que isto não é só coisas de padres: afinal, no nosso Batismo todos nós fomos instituídos como sacerdotes, profetas e reis. Ou aceitamos esta lógica, ou certamente vai doer-nos muito, principalmente porque nunca chegaremos a compreender quem é Deus!